Indústrias Seveso. A necessidade de conhecer.

A base dos países (apelidados de) desenvolvidos é a indústria. Desde a revolução industrial, grandes cidades aprenderam a viver porta-a-porta com zonas industrias que podem conter diversos tipos e quantidades de matérias perigosas. Em Portugal temos vários exemplos destas zonas, algumas delas até já foram noticia pelas piores razão, exemplo do incêndio na Sapec Agro, na península da Mitrena, Setúbal, em Fevereiro de 2017.

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Incêndio na Sapec Agro. (Jornal Público)

A directiva Seveso, “nascida” na ressaca dos acidentes de Flixborough (1974) e Seveso (1976), tem por objectivo definir “normas com vista à prevenção de acidentes graves que envolvem substâncias perigosas e à limitação das suas consequências para a saúde humana e para o ambiente, a fim de assegurar, de maneira coerente e eficaz, um nível de proteção elevado em toda a União”. Esta directiva europeia, que conta já com três revisões [Directiva 2012/18/EU “Seveso III”], foi publicada originalmente em 1982, e em Portugal está transposta no Decreto-Lei n.º 105/2015 de 5 de Agosto.

De acordo com dados da Comissão Europeia, em 2017 tínhamos uma frequência de 30 acidentes industriais graves por ano. Tendo em conta que a directiva Seveso é vista como um marco na segurança industrial, sendo seguida e aplicada um pouco por todo o globo, pode-se dizer que são números ainda preocupantes. Assim, a Comissão estabeleceu um ciclo de melhoramento, com vista a baixar estes números e a mitigar as suas consequências, assente em quatro pilares:

  • Prevenção: Estabelecer regras – legislação para a indústria, regimes de inspeção e partilha de informação,
  • Preparação: Limitar o risco – identificação e gestão do risco através medidas de segurança e de planeamento urbano,
  • Resposta: Limitar o impacto – criar e testar planos de emergência, comunicar medidas de segurança ao público,
  • Lições aprendidas: Aprender com a informação recolhida – reporte de acidentes e análise de dados.
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O ciclo de melhoramento (Comissão Europeia)

Por cá, a Autoridade Nacional de Proteção Civil (ANPC), criou dois cadernos técnicos com vista a auxiliar a elaboração dos Planos de Emergência Externos, o [Caderno Técnico PROCIV n.º2 – Guia da Informação Para a Elaboração de Planos de Emergência Externos (Diretiva “Seveso III”)] e o [Caderno Técnico PROCIV n.º7 – Manual de Apoio à Elaboração de Planos de Emergência Externos (Diretiva “Seveso III”)]. Estas publicações, embora direcionadas aos operadores de estabelecimentos de nível superior e Câmaras Municipais, são do interesse, e deverão ser consultadas, por todos os agentes de proteção civil.

São dois os Planos de Emergência exigidos com base no DL 105/2015: o interno (PEI), da responsabilidade do operador do estabelecimento, destina-se a controlar a situação na origem e a limitar as consequências, e o externo (PEExt), da responsabilidade da Câmara Municipal, visa mitigar e limitar os danos no exterior, organizando as entidades e agentes de proteção civil para a proteção da população. Os dois planos complementam-se e têm como objetivos:

  • Circunscrever e controlar os incidentes de modo a minimizar os seus efeitos e a limitar os danos na saúde humana, no ambiente e nos bens,
  • Aplicar as medidas necessárias para proteger a saúde humana e o ambiente dos efeitos de acidentes graves,
  • Comunicar as informações necessárias ao público e aos serviços ou autoridades territorialmente competentes relevantes da região,
  • Identificar medidas para a descontaminação e reabilitação do ambiente, na sequência de um acidente grave.

O PEExt é essencial para delinear uma resposta a eventual acidente industrial. Conhecer a estrutura do plano, e saber quais as informações disponibilizadas, pode ser a diferença entre uma resposta eficiente ou um conjunto de ações ineficazes.

Para os intervenientes em emergências

Para exemplificar a importância de conhecer o PEExt, usando um lugar já falado acima, vamos à Península da Mitrena, em Setúbal. O plano deste complexo está disponível no sitio da Câmara Municipal de Setúbal e também na página do Sistema de Informação de Planeamento de Emergência da ANPC. Embora o documento esteja bastante desatualizado, datado de 2010 ainda refere a directiva Seveso II, enumera a existência de 4 estabelecimentos de nível superior e lista as matérias perigosas com as quantidades.

Conhecendo a listagem de matérias perigosas existentes, os intervenientes num futuro acidente, podem desenvolver procedimentos de actuação que irão simplificar e agilizar uma futura intervenção. Actuando no âmbito da prevenção pode-se definir rotas preferenciais, verificar a adequabilidade dos equipamentos e viaturas ao perigo existente, definir métodos de actuação defensiva e/ou ofensiva, averiguar necessidade de aquisição de novos equipamentos (de proteção individual, por exemplo) e, muito importante, desenvolver competências e protocolos de descontaminação.

Para os cidadãos

Um dos objectivos desta directiva é, também, dar a conhecer aos cidadãos os perigos que podem existir perto da porta de casa. O grande problema é como se mostra essa informação ao público, como se actua na sensibilização e consciencialização. Em Portugal pode-se encontrar algumas (muito pouca) informação sobre estas industrias, além dos sites dos municípios, temos o SIEPE da ANPC, uma área na página da Agência Portuguesa do Ambiente e algo também na Inspeção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território.

O grande problema é que um cidadão não irá encontrar, em nenhum dos sítios acima referidos, a informação de uma forma directa, simples, clara… muito pelo contrário! E existem bons exemplos? sim, existem… em França!

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Página lesbonsreflexes.com

A região francesa de Auvergne-Rhône-Alpes criou a página lesbonsreflexes.com que informa os seus habitantes (cerca de 7,5 milhões de acordo com os censos de 2012) dos perigos industriais existentes e também ensina como actuar em caso de emergência. Uma das formas de comunicação de risco, complementar ao sitio digital e ás campanhas, são umas brochuras com muitas (e boas) informações para os cidadãos. Pode consultar um exemplo, em francês, bem demonstrativo do que podemos aspirar em Portugal. Outro (bom) exemplo chega da Bélgica: o r!sk-info.be!

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